14/07/2011

Aos Conselhos de Direitos

Conselhos dos Direitos: nos 21 anos do ECA desafios para a consolidação da democracia participativa
O ECA completa 21 anos dia 13 de julho e para a militância da infância e adolescência é uma data especial, mas que teve inicio antes de 1990 com toda a mobilização pela aprovação dos arts. 204 e 227 da Constituição Federal.
Desafios não faltam nestes 21 anos de Estatuto da Criança e do Adolescente: reordenamento dos serviços de acolhimentos, aplicação e execução das Medidas Socioeducativas, violências contra infância e adolescência, tráfico de drogas, trabalho infantil...
Mas há dois que gostaria de tratar nesta matéria.
O primeiro seria a participação da sociedade civil na democracia brasileira definida nos arts. 204 e 227 da constituição federal
Art. 204. As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195, além de outras fontes, e organizadas com base nas seguintes diretrizes:
II participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis.
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocálos a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação alterada pela Emenda Constitucional nº 65, de 13/07/2010 DOU 14/07/2010)
§ 7º No atendimento dos direitos da criança e do adolescente levarse á em consideração o disposto no art. 204
A criação dos Conselhos dos Direitos foi um marco na efetivação da democracia participativa brasileira. É a sociedade civil organizada e governo definindo juntos como se dará nas três esferas de poder as políticas para infância e adolescência. Expressão da participação social e política os Conselhos dos Direitos vem sofrendo, ao longo dos anos, com o descaso do executivo e com promoções de ações que dificultam ou impedem a efetiva participação popular. Podemos enumerar as diversas estratégias utilizadas pelo executivo para esvaziar estes espaços de deliberação e controle social: não designar de equipe técnica de suporte para o Conselho, faltar com material de apoio para atividades rotineiras, não destinar recursos para o Fundo da Infância e Adolescência, não publicar atas e resoluções, não viabilizar recursos financeiros que garantam a participação dos conselheiros nas reuniões e assembléias, dificultar o acesso dos conselheiros a documentos importantes como PPA, LDO, LOA.
Um atentando ao espírito de nossa lei maior, a Constituição Federal, que abre o texto de forma sublime estabelecendo no art. 1º, Parágrafo único: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
Além do executivo nos deparamos agora com o legislativo buscando cercear as funções estabelecidas pela Constituição Federal para os Conselhos: há municípios em que as câmaras legislativas têm apresentado projetos de leis que acabam com o poder deliberativo dos
conselhos, outras impõe aos Conselhos a validação de suas resoluções somente após aprovação do legislativo. Uma verdadeira afronta à constituição federal.
O segundo ponto diz respeito aos Art. 88. e. 86. do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Art. 86 A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente farseá através de um conjunto articulado de ações governamentais e nãogovernamentais, da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios.
Art. 88 . São diretrizes da política de atendimento:
I municipalização do atendimento;
II criação de conselhos municipais, estaduais e nacional dos direitos da criança e do adolescente, órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, assegurada a participação popular paritária por meio de organizações representativas, segundo leis federal, estaduais e municipais;
Quando o ECA estabelece como diretriz a descentralização e municipalização do atendimento define que ela será realizada em parceria entre governo e sociedade civil.
Mas o que vem ocorrendo hoje é a primazia da definição das políticas e da alocação dos recursos públicos pelo poder executivo. Além de ser o detentor dos recursos estabelecem de forma unilateral aonde estes recursos devem ser gastos, quando e como devem ser gastos. Descumprese o determinado no Estatuto da Criança e do Adolescente: municipalização e trabalho articulado governo e sociedade civil.
Na pratica não existe parceria, como detém os recursos é o governo quem dita às regras, e se as instituições da sociedade civil não concordam não conveniam, não são “parceiras”.
Deparamonos atualmente com o governo defendendo o sigilo nos gastos com as obras da Copa, ou seja, para os grandes empreendimentos garantese toda forma de recursos e com total sigilo, mas quando se trata de entidades ou instituições sociais o trato é de desconfiança, vide CPIs contra as organizações não governamentais.
A desmobilização da sociedade civil é uma constante desde início dos anos 90 quando os governos ditos democráticos chegaram ao poder. Trazendo para seus quadros militantes e assumindo o papel de mobilizar a sociedade civil o governo fragilizou os movimentos sociais. Será que se a proposição para aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente se desse nos dias de hoje a mobilização social que ocorreu nos anos 80 e 90 seria efetiva? Aprovaríamos o Estatuto nos dias de hoje?
Chegamos a um ponto em que quem lutou e garantiu a aprovação do art. 227 da Constituição Federal e do Estatuto da Criança do Adolescente tornouse hoje desmerecedor da confiança pública.
Mas e os Conselhos? Não são eles que definem as políticas? Não são paritários?
Diante da fragilização dos conselhos e da sociedade civil as decisões dos governos se tornam majoritárias, nas definições das políticas e na distribuição dos recursos públicos.
Diante destes desafios nestes 21 anos de Estatuto da Criança e do Adolescente fica uma reflexão: como garantir a participação social e a efetivação da democracia participativa? Uma
pista importante: investir na participação de crianças e adolescentes, ação contemplada na realização das conferências dos direitos da criança e do adolescente, mas que precisa ser ampliada para outros espaços de definição de políticas públicas assim como os locais de convivência da criança e adolescente como a família e a escola.
Fonte: Miriam Maria José dos Santos, Vicepresidente do CONANDA, de 08/07/2011, em razão do 21º aniversário do ECA.

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